quinta-feira, 29 de outubro de 2009

BIOGRAFIA DE GUIDO MONDIN



BIOGRAFIA DE GUIDO MONDIN

Fontes: Dicionário Histórico-biográfico pós-1930 – Rio de Janeiro

Ed. da Fundação Getúlio Vargas – CPDOC.2001

Enciclopédia Rio-grandense. Canoas: Ed. Regional, 1957.

GUIDO FERNANDO MONDIN nasceu em Porto Alegre, no dia 06 de maio de 1912. Era filho de Guido e Romana Ongaratto Mondin. Cursou o primário no Colégio São Luiz Batista de La Salle, em Porto Alegre. Diplomou-se contador pelo Instituto Comercial do Sindicato dos Empregados no Comércio, formando-se mais tarde em ciências Políticas e Econômicas pela PUC/RS. Cursou, ainda, o Instituto de Belas Artes. Participou da fundação da Associação de Artes Plásticas Francisco Lisboa, em Porto Alegre, no ano de 1938, juntamente com Carlos Alberto Pretrucci, Vasco Prado, Edgar Koetz e Mário Mônaco, entre outros.

Sua carreira política iniciou em 1950 quando foi eleito deputado estadual pelo Partido da Representação Popular (PRP). Durante seu mandato, foi presidente da comissão de Obras Públicas, membro da comissão de finanças e líder da bancada. Em 1954, elegeu-se suplente de Deputado Federal, tendo assumido entre março e maio de 1956. Antes disso, em 1955 havia sido eleito Vice-Prefeito de Caxias do Sul, assumindo a Prefeitura nos anos de 1957 e 1958, mesmo ano em que foi eleito senador pelo PRP com o apoio do Partido Trabalhista Brasileiro. Durante seu mandato, participou da Mesa do Senado. Na mesma época, presidiu o diretório regional do PRP no Rio Grande do Sul. Em 1960, participou de viagem de intercâmbio cultural aos Estados Unidos. Durante o bi-partidarismo, implementado no regime militar, ingressou na Aliança Renovadora Nacional (ARENA). Foi reeleito Senador em 1966, tendo, durante seu mandato, participado de diversas comissões.

Em 1975, foi nomeado Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) pelo Presidente Ernesto Geisel. De 1978 até sua aposentadoria em 1982, presidiu o TCU. Após sua aposentadoria, passou a dedicar-se mais intensamente às artes, realizando várias exposições. Tornou-se membro da Academia Brasileira de Artes e presidente da Associação Rio-grandense de Artes Plásticas. Atuou ainda na área jornalística e literária, sendo fundador e diretor do jornal Querer. Foi membro das academias de letras do Rio Grande do Sul, da Argentina e da Espanha. Além de Plano Contábil para Associações Rurais e Manual de Contabilidade para o agricultor, obras de caráter técnico, publicou, em 1979, “Reminiscências do 4º Distrito de Porto Alegre”, obras de memórias.

Por ocasião de sua morte, a Zero Hora publicou: “Aos 88 anos, morreu sábado, em Brasília, o ex-Senador Guido Mondin, que também se destacou no cenário nacional por sua dedicação às artes. Homem afável, culto, integrador, foi decisivo em importantes alianças com adversários políticos, como ocorreu em 1958 entre o Partido de Representação Popular, o seu PRP, de origem integralistas, de direita, e o PTB, situado à esquerda. Concorreu a prefeito de Caxias na primeira eleição depois da redemocratização, elegeu-se deputado estadual em 1950, foi o primeiro suplente de federal em 1954, assumindo na Câmara, foi Vice-Prefeito de Ruben Bento Alves, do PTB, em Caxias do Sul em 1955, antecipando uma aliança que ocorreria três anos depois em nível estadual. Junto com Alberto Hoffmann, eleito deputado federal, Mondin foi decisivo na eleição de Leonel Brizola para governador em 1958. Na aliança, conquistou uma cadeira no Senado, sendo reeleito pela Arena em 1966, numa seqüência de dois mandatos. Aposentou-se como ministro do Tribunal de Contas da União.

Mestre da pintura, doou à Assembléia Legislativa uma série sobre a Revolução Farroupilha. Outro destaque em sua obra é a Via sacra – as 14 estações estão pintadas na Igreja São Geraldo, seu bairro, onde uma rua leva o nome de seu pai, também Guido Mondin.”
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Senador Guido Mondin morre em Brasília

O político, pintor e escritor foi vítima de parada cardiorrespiratória

Zero Hora, 22 de maio de 2000 (Klécio Santos – Sucursal/Brasília)

O ex-senador Guido Fernando Mondin, 88 anos, morreu sábado em Brasília, onde residia desde a fundação da cidade, em conseqüência de uma parada cardiorrespiratória.

Mestre da pintura, uma paixão permanente desde que deixou a política em 1974, após dois mandatos no Senado, o economista e industrial Mondin foi enterrado ontem às 17h no cemitério Campo da Esperança.

O primeiro mandato de Mondin no Senado foi conquistado em 1958, na coligação do PRP (Partido de Representação Popular) com o PTB, de Leonel Brizola. Em 1966, se reelegeu pela ARENA, ocupando a cadeira de senador até 1975, quando passou a cadeira para Paulo Brossard. Ao deixar o Senado, exerceu o cargo de Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), sendo presidente em 1978. Natural de Porto Alegre, Mondin começou sua carreira política em 1948, como suplente de deputado estadual. Três anos depois conquistou uma cadeira na Assembléia Legislativa. Em 1955, foi Vice-Prefeiro de Caxias do Sul, antes ainda de começar a carreira vitoriosa no Senado.

Ao lado da política, realizava sua vocação de artista pintor, que despertou pela primeira vez aos seis anos de idade. Ainda guri, Mondin pediu à tia que estendia roupa no quintal:

-Fique quieta, que eu vou fazer seu retrato - disse, desenhando com carvão numa tábua velha.

Um ano depois, esteve pela primeira vez em um salão de pintura. Da infância pobre, herdou o gosto por retratar as mazelas sociais da vida brasileira, enaltecendo com retratos a figura do candango.

- A paisagem urbana não me atrai. As cidades-satélites, no entanto, oferecem temas e ricas sugestões como o drama desta gente humilde que veio para Brasília cheia de fé e esperança – costumava afirmar.

Além da pintura, Mondin se dedicou à literatura e à poesia, escrevendo várias obras

Além de Brasília, Mondin, nas suas telas, dava preferência aos temas do Rio Grande do Sul, em especial as paisagens campeiras. Sua paixão era tanta pela pintura, que mesmo depois de sofrer um derrame, que imobilizou seu lado direito, não desistiu. Passou a pintar seus quadros com a mão esquerda e costumava brincar com a situação.

- Acho que foi castigo eu, que sempre fui da direita, pintar com a mão esquerda – lascou certa vez o pintor, que tinha como seu modelo preferido Bolinha, seu cão de estimação.

Mas nem só de política e da pintura vivia Mondin. O ex-senador sempre esteve também ligado à literatura. Escreveu, entre outras obras, A Lenda do Lago, que em l996 foi tema de um balé encenado no Teatro Dulcina, em Brasília. Mondin também se orgulhava de ter fundado a Estância Gaúcha do Planalto com um grupo de amigos. Viúvo de Wera Gentz Mondin, o ex-senador teve dois filhos, Talita e Tito.”
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Guido Mondin – O Nosso Adeus

Jornal Tradição, de F. Pinto Fernandes


“Uma semana sem Guido Mondin. A saudade bate forte encurralando lembranças. São aproximadamente vinte anos de convivência pealando nos campos da tradição. Aqui viverei recuerdos do gaúcho rico em Rio Grande.

Guido Mondin durante sua vida deu exemplo da força de terra que emana dos campos pampeanos. Como o charrua, cavalgou liberto, a liberdade dos campos infinitos da querência verdejante. Descansou à sombra de figueiras. Bebeu leite de apojo na mangueira da vida. Na sombra das restingas da inspiração retratou a nossa terra de maneira única. Sua pintura cheira capim molhado de chuva. Minuano soprando. Vento de primavera. Calmaria de outono. Suor de pingo. Gadaria pastando. Bandeiras tricolor. Cargas de cavalaria em lances de guerra. Retrata o guasca abichornado oitavado num balcão de um bolicho de encruzilhada. No Rodeio dos Tempos é a história de nossa evolução sobressaindo imponente. É o Rio Grande puro, magestoso e belo que de seus pincéis nasce imortalizado da força férrea de amor do taura artista pela Capitania.

Galopando por outras invernadas, em textos recheados de gauchismo vamos encontrar Guido Mondin proseando com gosto de gajeta. Em poemas canta em versos a magia sulina da masculinidade entreverada de ternura. Na tribuna a fala livre do orador nato, em ecos de pago conta belezas.

O artista, o poeta, o escritor não fica na soga da arte. Usa-a no espalhar da amizade. Na franquia dos gestos é o gaúcho de todas as eras distribuindo regalos de estima e camaradagem. Na simplicidade dos capazes não tem baldas. É o amigo de todas as horas, de todos os momentos.”

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Guido Mondin e Caxias do Sul


Militante do Partido de Representação Popular (PRP), não estava em seus planos o exercício de cargos eletivos, mas apenas a militança partidária, a seu ver obrigação fundamental de cada cidadão. Não obstante, o Partido candidatou-se à Constituinte de 1946. Nada logrou, como não lograria eleger-se, logo após à Assembléia Legislativa. Nas primeiras eleições municipais, embora natural de Porto Alegre, Caxias do Sul viria buscar Guido Mondin como candidato à Prefeitura. Desenvolveu então memorável campanha na qual usou todos os recursos de sua imaginação, a que não faltaram a utilização de alto-falantes em aviões teco-teco, cinema de caricaturas pela parede dos edifícios, comícios ambulantes em que o candidato fazia-se seguir por dezenas de viaturas em grande mobilidade e programas de rádio de grande singularidade e receptividade. Perdeu, porém, embora por insignificante margem de votos.

Com marcada atuação, contudo não quis mais prosseguir na Assembléia para voltar à sua atividade particular. Na Assembléia, porém, liderara a Bancada e presidira as Comissões de Agricultura e de Obras Públicas, e o seu Partido exigia que, pelo menos, emprestasse seu nome para a chapa federal nas eleições seguintes. Colocou-se como primeiro suplente e assim pode retornar à ação privada.

Tanto para resolver um problema circunstancial de interesse público, a indicação foi aceita, mas Guido Mondin renunciaria a seguir, já havia iniciado a instalação de uma indústria em Caxias do Sul.

Em plena atividade industrial, uma coligação partidária viria a solicitar a sua colaboração agora candidatando-se a Vice-Prefeito.

Essa nova incumbência não interferiria em quase nada com a atividade que empreendera. A eleição foi consagrada. Por duas vezes, Guido Mondin assumiu a direção do município, levando aquele mesmo espírito de iniciativa que anunciara quando candidato à Prefeitura, anos antes.

Não tardou, porém a ser convocado para assumir seu posto a Câmara dos Deputados, como 1º Suplente que era. Deixando-a meses após, com a reassunção do titular. Guido Mondin não mais voltou à sua indústria, assumindo a Diretoria de uma empresa de construções.

O Livro “Guido Mondin na Academia Brasileira de Arte”, reproduz o discurso de recepção ao artista, proferido por Antônio Garcia de Miranda Netto. Interessante destacar a visão do orador sobre o gaúcho Guido Mondin: “Haverá dois anos, voltava eu, mais uma vez, ao nosso Rio Grande. Confesso que é sempre mais forte a emoção que me invade cada vez que o automóvel entra na estrada caprichosa que vai bordando o vale do Rio das Antas. As verdes encostas se fazem mais verdes e as manchas dos pinheirais, densas e escuras, contrastam com a clara luminosidade dos vinhedos, líquida esmeralda que brilha ao sol. Estamos chegando a Caxias, cidade tão do meu coração, onde há um século meu bisavô, tirolês, ao lado de dois companheiros vênetos abre a primeira clareira, levanta a primeira casa de troncos e cultiva a primeira rosa.

Recordo tudo isso porque foi em Caxias que, depois de breve atividade industrial, começastes a ouvir os cantos de sereia da política. Candidato à prefeitura, não poderia o artista, dono da ironia tão goldoniana, fazer campanha igual às outras. Aventura clamorosa e intolerável para os hábitos conservadores foram os quatro meses de vossa propaganda eleitoral. Fostes derrotado por meio dúzia de votos, mas até hoje são lembrados os episódios dessa jornada romântica a que não faltaram a novidade de teco-teco com alto-falante, nem a inédita projeção de caricaturas nas paredes dos edifícios, tortura dos que vos disputavam os votos. Em poderosa e mútua catálise, dialética arte foram mobilizadas para a vitória política.

Mas ‘ninguém passa impunemente por baixo das palmeiras’ – dizia Lessing. Principalmente quando há inveja e frustração. Ouvistes, de adversários, ameaças de morte, logo transformadas em enterro simbólico, porque lhes faltava ânimo de transformar em ato o desejo de vos eliminar corporalmente.

...Não poderíeis desmentir uma herança milenária: sois descendente de vênetos, raça diferente, que já enchia os gregos de admiração. Recebem a herança bizantina e a transformam na glória de Ticiano e Tintoretto. No século passado vêm trazer às serras do nosso Rio Grande o claro falar e o musical acento do dialeto de Goldono e Gozzi. Não só a língua vem com eles, mas as delícias de uma cozinha requintada e a arte - tão antiga – de transformar o escuro mosto que fermenta nos lagares no rubi escoro do Cabernet, com gosto de herva, no topazio sêco do Sauvignon ou na clara transparência do Riesling, que do Tirol traz o aroma das violetas e das framboesas maduras. Vênetos, friulanos, tiroleses e trentinos são mestres na requintada arte de bem comer e melhor beber. Talvez isso explique a maravilhosa escola de pintura do norte da Itália e, quem sabe, o vosso extremado amor pela arte. Estou convencido de que há uma correlação perfeita entre a boa mesa e a boa pintura.”

INTRODUÇÃO DO LIVRO VIA SACRA DE GUIDO MONDIN




INTRODUÇÃO DO LIVRO VIA SACRA DE GUIDO MONDIN

        Temos o prazer de entregar ao público mais uma obra de pesquisa. Neste ato, é um trabalho que busca resgatar a vida e a obra do ex-Senador Guido Fernando Mondin, que ao par de desempenhar importantes funções públicas, nas suas horas de folga, utilizava-as para a pintura. São centenas de obras e dentre elas queremos destacar, neste trabalho, a Via Sacra, que permitiu que fosse fotografada e posteriormente ampliada e se encontra na Igreja Matriz de Otávio Rocha, em Flores da Cunha/RS, bem como na Igreja São Geraldo em Porto Alegre. Compareceu ele na solenidade de inauguração, na serra, acompanhando o Governador Sinval Guazzeli. A obra assim adquiriu destaque e desde o ano de 1990, é atrativo de fé no interior daquele templo católico da região colonial italiana.

Tive o privilégio, em poucas oportunidades, é verdade, de conversar com o ex-Senador em sua casa atelier em Brasília e nas raras vezes, nos últimos anos, quando vinha para Caxias do Sul, onde tinha ainda alguns parentes.

A análise da via sacra é apresentada por várias transcrições de jornais, e os próprios textos descritivos por ele elaborados.

O livro permite apresentar com todas as cores, a obra, que tem assim a possibilidade de ser admirada por mais pessoas. Inclusive dentro do projeto turístico “Caminhos da Colônia” há a motivação para que se compare a via sacra de Aldo Locatelli, na Igreja de São Pelegrino, inspirada, no contexto em que a religião Católica, de um modo geral, apresenta a crucificação e a obra de Guido Mondin, em Otávio Rocha, que apresenta um novo enfoque das últimas horas da vida de Cristo sobre a terra.

A Revista Senatus de abril de 2004, ao publicar interessante matéria sobre a vida e obra de Guido Mondin, destaca: “Suas obras em óleo sobre tela retratam, notadamente cenas do cotidiano do povo gaúcho, das batalhas travadas e de seus heróis durante a Revolução Farroupilha. Porém, são suas telas religiosas as mais reconhecidas, tendo como representação máxima a sua Via Sacra, doada à Igreja Matriz de Otávio Rocha.”

Fica o meu agradecimento a todos os que colaboraram para que esta obra fosse possível ser concretizada.

Floriano Molon -  contato  fmolon@cpovo.net

ARTIGO DO DR. VICTOR FACCIONI

DR. VICTOR FACCIONI

Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul

Em “Um Olhar Farroupilha – Guido Mondin Arte e História”

Ministério Público e Assembléia Legislativa - 2005





O GIGANTE DA TELA





“Falar de Guido Mondin pintor não é tarefa fácil, já que esse gigante das telas conquistou um lugar de destaque por suas obras admiradas e disputadas até no exterior. Conheci-o quando eu, ainda menino, e Mondin, em campanha política de deputado, esteve em Carlos Barbosa, onde eu residia com meus pais, aproveitando, inclusive, para visitar a sapataria de meu pai, que lhe dava apoio local, e que ficava junto à casa onde morávamos. Anos passaram, e ainda eu era deputado estadual e chefe da Casa Civil, fui convidado para assumir a presidência do Conselho Estadual de Escoteiros, e Mondin era o Presidente da União dos Escoteiros do Brasil. Com entusiasmo verdadeiramente juvenil, a despeito de sua idade, ele emprestava decisivo apoio ao escotismo, movimento internacional dos mais sadios, para o exercício da fraternidade cívica da juventude, sintetizada na saudação ‘Sempre alerta!’, com que os escoteiros se cumprimentam.

Depois quando me elegi deputado federal, com ele convivi, em Brasília, pude então conhecer toda sua bagagem cultural e política. Além de ter sido vice-prefeito de Caxias do Sul e deputado estadual constituinte em 1949, posteriormente elegeu-se para a Câmara dos Deputados, e, depois, duas vezes para Senador da República, por dezesseis anos. Em 1975, chegou ao Tribunal de Contas da União, presidindo-o em 1978. Aposentou-se ao completar 70 anos de idade, em 1982, passando a dedicar-se inteiramente ao que mais gostava de fazer: pintar. Era, além, disso, um homem muito espirituoso, extrovertido e de grandes qualidades intelectuais.

Como pintor, é autor de 4.200 telas espalhadas pelo mundo, conforme sua filha Talita, que reside em Brasília. Em muitas delas, expressa sua convicção religiosa e sua fé cristã, Além de coletânea que compõe o acervo cultural do Senado da República, se encontra exposta na Assembléia Legislativa do Estado, uma exclusiva sobre a História da Revolução Farroupilha. O Legislativo gaúcho, querendo dar maior destaque a essa coleção, em 2003, inaugurou uma galeria no acesso ao Gabinete da Presidência, onde podem ser admiradas essas obras, que relembram os principais heróis e momentos da Sega Farroupilha, da qual estamos, agora, comemorando 170 anos.

Ele também pintou para as Igrejas de Otávio Rocha, em Flores da Cunha, na região italiana, e São Geraldo, em Porto Alegre, belas vias sacras, reproduzindo com rara transparência as cenas da paixão de Cristo. Mas, as telas de Guido Mondin fazem sucesso até no exterior, onde as encontramos inclusive na Casa Branca, em Washington; no Uruguai e em vários países da Europa.

Ao deixar o TCU, ele retornou a Caxias do Sul e à região, lá ficando algum tempo, para rever paisagens e pintar quadros com a temática regional. Num vernisage, em Caxias, a seu convite, lá estive para escolher alguns quadros. Entre os que comprei, destaco o do Retorno de Nanetto Pipetta, personagem criado pelo Frei Paulino, de um imigrante italiano que veio ao Brasil para ‘fazer a América’.

Sua história começou a ser publicada em dialeto italiano, na década de 20, na “Stafeta Riograndense”, hoje “Correio Riograndense”, semanário dos Padres Capuchinhos. A conselho do Provincial, o frei deixou de publicar essa história, pois entendeu seu superior que era pouco edificante para os jovens. Daí, no último capítulo, Nanetto Pipetta foi pescar no rio Caí e seu anzol ficou preso numa pedra. Ao querer libertá-lo, pisou num buraco e se afogou. Guido Mondin, porém, ao constatar que Nanetto Pipetta estava ainda bem vivo na memória do povo, e, à época de sua pesquisa, estava em cena uma peça teatral sobre o herói, resolveu pintar a volta de Nanetto Pipetta, pois entendeu que continuava vivo, ao menos, na cultura local. Colocou-o, então, ao lado do Frei Paulino, ‘seu criador’, com uma corda passando pelo ombro, querendo significar que não havia se afogado no rio, mas na hora que isso estava por acontecer, a mão salvadora de um amigo lhe lançara uma corda com a qual sobreviveu.

No Tribunal de Contas do Estado, existem duas telas de Guido Mondin, muito expressivas e que, de certa forma, complementam a coletânea da Saga Farroupilha do Legislativo. Uma delas é a ‘Carga Farrapa’, e a outra, no gabinete da presidência, reproduzindo uma paisagem do pampa gaúcho: ‘Meu Rio Grande Amado’. Dada minha ligação com Mondin, quando cheguei ao Tribunal, vi essas duas telas e, ao lançar a Revista do Planejamento Estratégico, que inclusive fundamentou a Certificação de Qualidade ISSO 9001:2000, obtida pela nossa Corte de Contas com aprovação de meus pares, utilizamos na capa a pintura da ‘Carga Farrapa’. Tal foi a receptividade que, num segundo momento, decidimos transformar a sua réplica numa honraria que o Tribunal concede a quem se destacou na prestação de serviços na gestão pública. Já distribuímos essa honraria a personalidades estaduais, nacionais e estrangeiras.

Muito e muito ainda se poderia escrever sobre Guido Mondin, sua personalidade política – marcada sempre pela honradez e ética, desde vice-prefeito de Caxias do Sul, deputado estadual constituinte, deputado federal, senador e, depois, como ministro-presidente do Tribunal de Contas da União -, e sua sensibilidade artística na expressão de seus quadros e telas. Falecido em 20 de maio de 2000, Mondin foi filho de imigrantes italianos, cuja vinda dos pioneiros estamos comemorando 130 anos. Os seus quadros e telas, porém, falam bem mais alto que qualquer outra referência. Na medida em que são vistos, ele passa a ser admirado e reconhecido como um dos nossos grandes pintores contemporâneos, que honram o Rio Grande e o Brasil. Oportuna, portanto, a decisão do Procurador de Justiça, Dr. Ricardo Vaz Seelig, coordenador do Memorial do Ministério Público, e do Procurador-Geral de Justiça, Dr. Roberto Bandeira Pereira, em parceria com a Assembléia Legislativa, presidida pelo deputado Iradir Pietroski, de publicar a obra à qual estamos nos associando, comemorativa dos 170 anos da Revolução Farroupilha e do Poder Legislativo gaúcho, bem como dos 130 anos da Imigração italiana em nosso Estado, com ressonância plena não só entre os descendentes dos imigrantes italianos, mas em toda a comunidade rio-grandense.”





ARTIGO DO PROFESSOR MÁRIO GARDELIN




MÁRIO GARDELIN

Assessor para Assuntos de Povoamento, Imigração e Colonização da Universidade de Caxias do Sul



Recebo a incumbência de apresentar o livro de Floriano Molon intitulado A VIA SACRA DE GUIDO MONDIN. É verdade que há, neste livro, um trabalho e referências epistolares minhas. Trata-se, porém, de assuntos de ocasião. Esta apresentação, tanto quanto o permitam meus 78 anos bem vividos e fatigados, será escrita com o coração. Vou baixar os paus da mangueira e soltá-lo em campo aberto. E, por primeiro, falarei de como me relacionei com o meu multi-candidato e estremecido amigo Guido Fernando Mondin. Depois, tratarei de Floriano Molon. E por último da Via Sacra.

Recebi, no meu Colégio Murialdo, Ana Rech, Caxias do Sul, uma primorosa formação cívica. Em função dela, quando a 29 de outubro de 1945 o Presidente Vargas foi deposto e se recolheu à sua estância de São Borja, passei a interessar-me vivamente pela evolução política. Devo dizer que meu primeiro voto foi a 19 de janeiro de 1947; votei em Valter Só Jobim para Governador. Participei da campanha eleitoral municipal em que Guido Fernando Mondin foi candidato a Prefeito. Depois de um comício, apresentei-me a ele. Dei-lhe um grande abraço e a certeza de que suas idéias e as minhas combinavam perfeitamente. Minhas relações com ele, entretanto, tornaram-se mais constantes e profundas a partir do momento em que passei a trabalhar no semanário O Pioneiro. Desde seus primeiros números, nele Mondin publicava magníficas colaborações. Essas relações tornaram-se pessoas com a minha transferência para Porto Alegre, onde passei a trabalhar na Texas Co. Foram meses de intenso aprendizado. Aproveitei para fazer vestibular na PUC. Fui bem. Não dei continuidade a meus estudos, que só os retomei na Faculdade de Filosofia de Caxias do Sul, onde me formei.

Guido Mondin trabalhava na FARSUL, pintava, lia e fazia poesias. De tudo isto, em nossos encontros, me falava com detalhes. Foi uma iniciação, que seria de grande valia, quando passei a integrar a Câmara de Vereadores de Caxias do Sul. E de valia cultural, pois estava-se aos tempos em que Carlos Reverbel projetava nova luza sobre o Rio Grande do Sul, divulgando trabalhos inéditos do Capitão da guarda Nacional João Simões Lopes Neto.

Creio ter sido nessa época, que Guido Mondin me contou um fato curioso, acontecido com ele, à noite, em seu atelier. Recebera a incumbência de pintar um retrato de um patriarca de bela família. Dele restara, entretanto, apenas um pequena fotografia, maltratada pelo tempo. Mondin logo percebeu que os familiares do homenageado esperavam dele uma miraculosa proeza de arte, que retratinho inicial não poderia proporcionar. Pensou muito no assunto.

O atelier tinha uma cadeira à frente; a tela, imaculadamente branca, estava posta em posição perfeita em relação à cadeira. A porta da sala estava fechada. Mondin reduziu a iluminação local. E eis que a porta se abre, um homem alto, de barbas imponentes, trajado à gaúcha, entrou e foi assentar-se na cadeira. Mondin não se fez perguntas e nem saudou o austero visitante. Pronto o quadro, o patriarca ergueu-se e a passos solenes retirou-se.

Que segredo esconde esse fato? Creio que a ciência pode explicá-lo. Mondin assenhoreou-se dos traços da pequena fotografia, absorveu-os e na quietude do atelier, numa noite de sossego, projetou-a mentalmente em sua frente, operando-se a materialização. Quanto ele me contou essa ocorrência, limitei-me a achar o fato fora do comum. Já me referi, por escrito, a ele. Acho, porém, que ele merece figurar no livro do meu caro Floriano Molon. Finalizarei dizendo que os descendentes do patriarca ficaram estupefatos. E evidentemente muito felizes.

De Mondin recebi um pedido: fotografar a cores nossa esplendente natureza, para servir-lhe de informação em seus quadros. Ele era um entusiasta da beleza de nossa serra.

Dele, tenho em minha biblioteca um retrato que me representa por essa época. Resistiu ao tempo e às boladas de meus três filhos, que, quando eu não estava em casa, se divertiam alvejando-a . Antes de escrever estas linhas, fui observar a obra de arte. Contemplei-a fixamente. Esboçou-se nele, em meu rosto e nos lábios, um sorriso que não sei se é de ironia ou de minha distantíssima mocidade. Para mim basta que ele seja uma lembrança e uma presença perene de um grande homem.

De Floriano Molon o leitor encontrará os dados precisos. Quanto a mim recordo-o naquele cenário que passei a apreciar, quando, com meu avô materno João Dall’Alba, ia à missa dominical na Igreja de Flores da Cunha, aos tempos em que chamava Nova Trento. Deslumbrava-me o caminho entre a nossa Capela de São Valentim e a cidade. Mais tarde, em função do Pioneiro, passei a vivenciar a beleza de toda a nossa região e de modo especial Otávio Rocha. Colaborei com Floriano, e sentia-me feliz em vê-lo tão entusiasta. Participei de Festas em Otávio Rocha, saudadas por um poderoso canhão. Entusiasmei-me com o titular da comunidade, o Tenente-Coronel Graduado Dr. Otávio Francisco da Rocha. Propus à Câmara de Vereadores de Caxias do Sul a denominação de uma rua com seu nome. Localizei literatura dialetal, contestando sua presença na política. Era um documento de ocasião, sem maior valor.

Apreciei todas as obras que Floriano Molon produziu. Trata-se de uma bagagem consagradora.

E, por fim, cabe-me falar da Via Sacra. Como premissa, recordo-me de algumas conversas que tive com Guido Mondin, a respeito da Via Sacra de Aldo Locatelli, existente na Igreja se São Pelegrino. É que, por mercê do Padre Eugênio Ângelo Giordani, por dezenas de anos fui Tesoureiro da Associação Cultural Aldo Locatelli. Foi um posto invejável pelas informações que pude colher. Guido Mondin estudou a realização de Locatelli. Interpretou a narrativa evangélica. O leitor encontrará considerações que expus em artigo adiante transcrito. Ao finalizar meu trabalho, indaguei: “Teremos nós o privilégio de um dia vê-la em alguma de nossas igrejas ou em algum de nossos museus?” É evidente que igreja e museu são lugares aptos para guardar uma grande obra de arte.

A Via Sacra, porém, e muito mais do que uma obra de arte. Representa a humanidade de Cristo, transfigurada pela sua divindade. Ele é submetido a padecimentos que homem algum jamais suportou. Ele é o homem perfeito, o rei da criação, o ápice de tudo quando é belo, bom e verdadeiro. Tem, portanto, uma capacidade de sofrimento máxima. E isso constitui o sacrifício expiatório, por todos os pecados dos homens, desde Adão e Eva.

Coube à nossa Otávio Rocha hospedar a Via Sacra. Digo hospedar porque se trata de uma obra viva, capaz de irradiar amor redentor. É uma grande obra de arte, sem dúvida. É, também, em sua máxima expressão, uma visão de Cristo no caminho e na morte na cruz. É uma visão que pressagia a ressurreição gloriosa de todos aqueles que, conhecendo o amaram, e de todos aqueles que viveram centenas de milhares de anos antes que viesse ao mundo. E que amaram o próximo, através de atos de caridade, sendo pelos méritos desses atos conduzidos à glória eterna. Feliz és, ó bela Otávio Rocha, por teres esplêndido tesouro.

Caxias do Sul, 3 de dezembro de 2005, dia de São Francisco Xavier.